domingo, 23 de maio de 2010

O OUTRO BLOG





Sempre soube que precisava escrever. Comecei assim que aprendi, espontaneamente. Na infância, na adolescência escrevia muito, depois parei. Comecei a ter que usar desculpas. O cartão de aniversário de um amigo, de amigos de amigos, cartas de reclamações pra operadora de telefonia, aniversário de cachorro, batizado de boneca (parecendo coisa de alcoolatra, né?)... Escrevo cada email pra banco!!!!! Uma vez fiz uma carta de demissão que emocionou a responsável pelo departamento pessoal da empresa. Ela chegou a me dizer que a minha devia ser usada como modelo para todas as cartas de demissão (quanto orgulho!!!!).

Aí os blogs surgiram na minha vida. E os comentários. E as pessoas. Vivo falando aqui dos meus amigos. Acho que às vezes pode até ficar parecendo papo de altoajuda, mas não é. Duas delas souberam que eu precisava ter um blog antes que eu mesma soubesse. Enquanto uma discutia a ideia ("ideia" não tem mais acento) tentando me convencer a outra me arrumou a desculpa perfeita: precisava de alguém que a ajudasse em seu próprio blog já que ela estaria muito atarefada. Foi assim que vim parar aqui.

E contava todas as histórias menos a que gritava pra ser contada. Era um projeto secreto. Tão secreto que nem eu sabia dele. Mas já existia e agora está vindo a tona. Sinto como se estivesse indo pra casa, cumprindo meu destino. Quero que as pessoas saibam como é boa essa sensação. A de voltar a habitar o próprio corpo, de ocupar o próprio espaço. É isso que o
Alta Estima significa pra mim. Quero colocar nele um pouco mais da escritora, quero que ele seja mais focado, com intenções mais sérias.

E o Deboniando?? Vai continuar pra mim... É nosso diário,
nosso confissionário, como diria meu irmão, nosso terreiro de casa. A casa onde encontro meus amigos. Esses que torcem por mim com tanta força que chega a doer. Da pra sentir daqui (o "da" também não tem mais acento). É a eles que eu queria agradecer. Principalmente às duas do começo, Aninha e Its, por me fazerem assumir meu sonho. A minha Ju que nunca desiste de mim (eu, se fosse ela, já tinha chutado o pau da barraca) e pelas fotos, onde ela fez milagres... À Martinha pelo carinho, paciência e encorajamento. Ao meu fã, Eduardo, que ou me incentiva ou me enlouquece. A Clarinha, Isa, Feliz, Jota, Gi, Thaís, Guga e todo seu povo. Todos sempre afagaram meus escritos.

E vou aproveitar e fazer meu comercial... Dizer que segunda feira tem post novo e pedir a todos que divulguem. Os que gostam que divulguem entre os amigos e os que não gostam entre os inimigos!

Sonho que se sonha só
É só um sonho que se sonha só
Mas sonho que se sonha junto é realidade
Raul Seixas
Beijos

Ana Mineira


Nosso beijo enoooorme pro filhotinho da Scarlett!!!!


Iago, meu lindo!!!! Muita felicidade pra você!!!

Aproveita o privilégio de ter nascido numa família tão cheia de amor e realize todos os seus desejos!!!!


terça-feira, 18 de maio de 2010

XURUMELAS


Eu não sei se vocês sabem, mas mulheres que moram na mesma casa ou que passam muito tempo juntas acabam sincronizando seus ciclos menstruais. Não é mito, é Natureza. Em seu período fértil as fêmeas humanas
liberam feromônios, substâncias que emitem certos indícios só perceptíveis para outros da mesma espécie. Os feromônios sexuais são capazes de induzir o comportamento reprodutivo. Nosso consciente não percebe quando fazemos isso e nem quando outras fazem, mas um lado de nós sabe. E esse lado está competindo para ter a melhor descendência (que seria a maior, mais saudável e mais duradoura segundo nossos instintos), então não queremos que outra mulher fique com todos os machos do território, muito menos os melhores. O que nosso corpo resolve fazer? "Entrar no cio" ao mesmo tempo, porque aí disputaremos de igual pra igual. Maquiavélico, não? É... Lei da Natureza.

Tenho certeza de que isso já aconteceu comigo, mais de uma vez. Por causa de estudo ou de trabalho houve épocas em que passava quase todo o dia na companhia das mesmas mulheres. Se formos analisar na prática da minha realidade as estratégias foram totalmente desperdiçadas, já que tive apenas um filho, com o parceiro com quem fiquei boa parte da minha vida e ainda usava métodos contraceptivos. Mas é genético, é ancestral e meu corpo vai continuar fazendo isso, o que não significa que eu vou ter que entrar na disputa da melhor prole. Mulheres modernas têm planos pra suas vidas e não da pra se deixar dominar por competição evolutiva.

Da mesma forma fomos geneticamente projetados pra disputar tudo, como todos os animais fazem. Nenhum bicho tem pudor de querer para si e para os seus a melhor comida, o melhor ninho, a melhor água e nem tem escrúpulos de fazer o que tiver que ser feito para consegui-los. Nós só não fazemos o mesmo (geralmente, né?) porque nossa racionalidade criou regras... Nos educamos e nos reprimimos para respeitar o limite do outro, desobedecendo aos nossos impulsos primários. Ou seja toda a vida moderna em sociedade está baseada nesse auto-controle. Coisa da qual homens sempre se gabaram de ser melhores que as mulheres, eles são os mais racionais. Então por que quando se chega à questão dos instintos sexuais masculinos a conversa fica tão diferente?

Sem fazer nenhum juízo de valor: pessoas tomam a decisão de trair. Homens e mulheres traem os seus parceiros porque querem, porque se permitem. Não é porque a zinha embarangou, ou porque o zinho não da atenção ou porque Pafúncio solta pum ou porque Tiburcina usa creme na cara e muito menos porque é homem e a missão é espalhar a semente. Deu vontade e pronto! Resolveram encarar as possíveis consequências e satisfazer um desejo. Outras pessoas podem ter tido o desejo e decidiram não satisfazer e outras nem tiveram o desejo.


O caso é que fidelidade exige esforço.
Relações monogâmicas são difíceis para todos os envolvidos! Perguntem às araras, aos pinguins, aos cisnes... Perguntem aos homens e mulheres que não traem. Mas parem com as desculpas preconceituosas. Homens traem porque obedecem seus instintos? Senhores, por favor, não me venham com xurumelas!!

*Ainda repercussão do post do Pergunte ao Urso: Por que os homens traem? eles estão sempre olhando pra outra mulher?



Beijos

Ana Mineira

quarta-feira, 12 de maio de 2010

TODA CRIANÇA QUER



A vida tem um curso mágico às vezes... Como se nossos caminhos estivessem sendo costurados por mãos invisíveis...


Sexta-feira passada escrevi um texto (Aprendendo a conviver com a diferença) sobre um encontro que eu, meu filhote e um amiguinho tivemos com o João, no McDonald's. O João tem mais ou menos a mesma idade dos meninos e tem Síndrome de Down. A situação em si foi linda e mexeu muito comigo. Mas nada me preparou para a resposta que o post teve. Sites de inclusão de pessoas com várias deficiências, blogs de pais, emails emocionantes e emocionados de mães de crianças Down, todos se manifestando, publicando o texto em seus espaços. Para usar uma palavra que eles gostam muito, foi especial.

Apesar de ter ficado nas nuvens com o carinho, como respondi pra alguns, não cabe agradecimento, que é pra quem faz uma coisa fora do comum. Eu não fiz favor nenhum a ninguém. Respeitar o outro e ensinar crianças a fazer o mesmo é obrigação de todo adulto. Não olhar como coitadinho, não olhar como um filhotinho de cachorro engraçadinho, mas simplesmente como uma pessoa que tem necessidades especiais sim, mas que está aí, no mundo pra viver intensamente e da melhor maneira possível todas as experiências que puder e quiser. Como o resto de nós.

Beijos especiais para o Lúcio Carvalho e a equipe do site Inclusive, para o MAQ do site A Bengala Legal, para o blog Cantinho do Rodrigo, para Sol e sua princesa Mari, para Andréa e sua bonequinha Caroline e todos os outros que nos leram.

Queria dizer a todas essas pessoas que contem sempre conosco: comigo, com a Aninha, minha amiga e sócia de empreitada e com o blog Deboniando e seus amigos queridos para apoiar suas causas, principalmente a da inclusão. Vocês que enfrentam essa luta com tanta garra e coragem são seres epeciais. E, apesar das evidências, realmente acredito que seguimos pra uma sociedade menos cruel, eu quero participar disso e os vejo como parte do caminho.




Beijos

Ana Mineira

terça-feira, 11 de maio de 2010

HERANÇA

Essa semana ouvi no rádio a música "Tropicália", de Caetano Veloso, que é do álbum com o mesmo nome, lançado entre 1968 e 1969, e que deu o nome ao movimento do Tropicalismo.
Deve ter sido uma das primeiras vezes que a ouvi no rádio. Não é muito conhecida, até porque é forte, pesada de ouvir em todos os sentidos. Ainda assim a conheço desde muito pequena. Meu irmão também. É uma das nossas canções preferidas de todos os tempos.


Sobre a cabeça os aviões
Sob os meus pés, os caminhões
Aponta contra os chapadões,
Meu nariz


Eu organizo o movimento
Eu oriento o carnaval
Eu inauguro o monumento
No planalto central do país

Viva a bossa, sa, sa
Viva a palhoça, ça, ça, ça, ça

O monumento é de papel crepom e prata
Os olhos verdes da mulata
A cabeleira esconde atrás da verde mata
O luar do sertão

O monumento não tem porta
A entrada é uma rua antiga,estreita e torta
E no joelho uma criança sorridente,feia e morta,
Estende a mão

Viva a mata, ta, ta
Viva a mulata, ta, ta, ta, ta

No pátio interno há uma piscina
Com água azul de Amaralina
Coqueiro, brisa e fala nordestina
E faróis

Na mão direita tem uma roseira
Autenticando eterna primavera
E no jardim os urubus passeiam a tarde inteira
Entre os girassóis


Viva Maria, ia, ia
Viva a Bahia, ia, ia, ia, ia

No pulso esquerdo o bang-bang
Em suas veias corre muito pouco sangue
Mas seu coração
Balança a um samba de tamborim

Emite acordes dissonantes
Pelos cinco mil alto-falantes
Senhoras e senhores
Ele pões os olhos grandes sobre mim

Viva Iracema, ma, ma
Viva Ipanema, ma, ma, ma, ma

Domingo é o fino-da-bossa
Segunda-feira está na fossa
Terça-feira vai à roça
Porém

O monumento
é bem moderno
Não disse nada do modelo do meu terno
Que tudo mais vá pro inferno, meu bem
Que tudo mais vá pro inferno, meu bem

Viva a banda, da, da
Carmen Miranda, da, da, da da, da da da

Não foi através dos meus pais, que sempre foram muito conservadores em termos de música, e ouviam tangos, boleros e seresteiros. Mas na casa da minha avó, onde passávamos boa parte do tempo, meu tio mais novo tinha discos interessantes. Entre eles uma coletânea de banca de revista do Caetano, que tocava sem parar. Nós crianças, espojinhas que éramos, em pouco tempo sabíamos de cor "Alegria, alegria", "Baby", "London, London" e, claro, "Tropicália". Aquela melodia, aqueles versos cresceram em nós e conosco e foram determinantes pra nossa formação musical, pra nossa formação humana (a música sempre ocupou e ocupa ainda uma boa parte do nosso universo).



Outro LP (ah, gente!!! por favor não façam cara de desentendidos, você sabem o que é...) que nos invadia e me lembro da capa como se fosse hoje, era Refazenda, do Gil. Todo maravilhoso, do início ao fim...

Traga-me um copo d'água, tenho sede
E essa sede pode me matar
Minha garganta pede um pouco d'água
E os meus olhos pedem seu olhar



Pairando sobre tudo isso estava o ídolo maior do meu tio. Quem?? Ele, Chico Buarque. Se eu fechar os olhos vejo a casa, sinto o clima do piano e das sirenes e ouço os versos geniais que não entendia na época:

Acorda, amor
Eu tive um pesadelo agora
Sonhei que tinha gente lá fora
Batendo no portão, que aflição
Era a dura, numa muito escura viatura
Minha nossa santa criatura
Chame, chame, chame, chame o ladrão.



É engraçado como uma pessoa sem saber, sem querer, pode influenciar tanto na vida de outras. E foi o que aconteceu. Meu tio era muito jovem e só estava curtindo seus discos modernos. Mas de alguma forma, que não sei explicar, é como se soubéssemos da relevância daquelas aulas involuntárias, então devorávamos versos e sons, caladinhos... Foi a riqueza da música que despertou em nós o gosto, o ouvido, e que acabou se tornando um presente, uma herança das mais valiosas.

Beijos

Ana Mineira

sábado, 8 de maio de 2010

MÃE QUE TEM MÃE




Julia era a mãe de John Lennon.
Ela não o criou e acabou morrendo prematuramente,
mas ele tinha por ela verdadeira adoração

Um dos versos de música de que eu mais gosto e de que me lembro sempre vem de uma canção do Ira!, Dias de luta: "Se meu filho nem nasceu, eu ainda sou o filho". É a pura verdade. E acho que entendi toda a dimensão dessa frase, que, na verdade, é muito mais significativa do que parece, depois que virei mãe. Até termos filhos somos filhos, depois...

Há nove anos pra mim o Dia das Mães tem sido um momento de refletir sobre o meu papel de mãe e nada mais. Acho que depois que eles nascem a gente fica meio condicionada, todas vez que ouve a palavra "mãe", o que vem na cabeça é "filho" (Como será que ele está? Está seguro? Está feliz? Está precisando de mim?). Nossas próprias mães acabam relegadas a um papel coadjuvante, que aceitam com o coração aberto.

Minha mãe é uma das criaturas mais sem frescura que já conheci na vida. Pra ela tudo é fácil e possível. E faz com uma entrega, com uma dedicação que o resultado é invariavelmente simples e perfeito. É meio mãe do mundo e acha que é seu dever cuidar de todos os seres que cruzam o seu caminho. Foi ela que me ensinou que ser mulher, ou pobre não é defeito. Pelo contrário. Dentro daquela simplicidade comovente ela carrega todo orgulho do mundo, sem nenhuma soberba. Adora paparicar, adular, sem nunca perder aquela aura de quem está zelando pelos seus pequeninos. Cuida de um bando de nobres ou de mendigos com a mesma dignidade. Sempre se torna uma referência onde passa. Todos têm alguma coisa pra perguntar pra ela. Todos querem sua companhia. É tão mãe que foi mãe da própria mãe.

Uma vez estava comentando com uma conhecida sobre um acontecimento, nem lembro mais o quê ou sobre quem, mas eu dizia que concordar com atitudes de desrespeito era inaceitável e absurdo. Ela ficou calada e pensativa e depois disse: "Você deve ter sido muito amada quando criança". Por um momento não entendi, mas quando olhei pra ela vi o que queria dizer: só tem segurança para rejeitar o desprezo e o desamor quem foi amado. Não é uma coisa que nasce conosco. Se eu enxergava assim é porque tinha tido o privilégio de aprender a ser assim. E foi com minha mãe... Ela sempre me amou muito.

Por isso aqui, agora não vou ser mãe, vou ser filha. Vou me divertir e me emocionar lembrando que, até hoje, minha mãe está atenta a todos os detalhes da minha vida, como se eu tivesse acabado de nascer. Ainda fica adivinhando meus desejos e necessidades. Ainda desenrola as golas das minhas blusas e limpa meu rosto com cuspe. Ainda da palpite em tudo e se acha na obrigação de decidir por mim. Ainda acha que tudo que acontece de mais pesado na minha vida (ainda que aconteça na de todo mundo) é injusto. Ainda me acha a melhor, a mais bonita, mais perfeita e mais interessante. Como é bom saber que pra ela vou ser sempre pequena e frágil, mesmo se for eu quem estiver cuidando. Da um alento, um conforto... Aí então, lembro da minha conhecida e não consigo deixar de pensar: todo mundo merecia ter isso.

Metade do que eu digo não faz sentido
Mas digo apenas pra te alcançar, Julia
Julia, filha do oceano, me chama...
Então eu canto uma canção de amor, Julia.
Olhos de concha do mar, sorriso de vento, ela me chama
Então eu canto uma canção de amor, Julia.
Seu cabelo de céu flutuante está brilhando,
Reluzindo ao sol
Julia, Julia, lua da manhã, me toque
Então eu canto uma canção de amor, Julia.
Quando eu não consigo cantar meu coração
Só posso dizer o que penso
Areia adormecida, nuvem silenciosa, me toque
Então eu canto uma canção de amor, Julia.
Ela me chama
Então eu canto uma canção de amor para Julia.


Beijos

Ana Mineira

sexta-feira, 7 de maio de 2010

APRENDENDO A CONVIVER COM A DIFERENÇA


Chega o fim de semana... E quem tem filho começa as orações pra Nossa Senhora do Programa de Indio. No último, depois de ter ouvido lamentações de segunda a sexta implorando por McDonald's (o que pra mim significa: comida ruim, Coca-Cola com gelo, mesmo que você implore pra não colocar, repetir 364 vezes "termina o lanche!" e passar horas olhando pro nada esperando crianças se cansarem de brincar) me rendi. Como não sou boba fui preparada: aparelho de música com fone de ouvido e livro. E estava dando certo... Filho e amiguinho se esbaldando... só ouvia a gritaria de longe e percebia vagamente os vultos em minha volta...

Até que chegou o João. Com uns 9 anos, a mesma idade dos meus (na verdade só tenho um, mas estou sempre com vários e quando estão comigo são todos meus) estava com a mãe e a irmã e ficou parado no canto do pátio observando a movimentação, como só as crianças sabem fazer... Aos poucos os três foram se aproximando e resolveram brincar de pega-pega. Quando ficaram exaustos se sentaram e foram jogar cartas de Bakugan (se você não faz a menor idéia do que se trata, fique apenas feliz por isso e esqueça o assunto). João distribuiu o baralho e eles passaram um tempão muito entretidos, até a mãe dele ter que ir embora, no meio de muitos protestos. Nada demais, não é? Apenas crianças brincando... Seria sim, não fosse por um detalhe: João tem Síndrome de Down.


Quando ele chegou fechei meu livro e fui observar como ia interagir. A princípio pensei que fosse procurar as crianças menores, fiquei ainda mais curiosa quando vi que ele queria brincar com os "meus". Sei que meu filho e seu amigo não têm nenhuma intimidade com pessoas com necessidades especiais, não me lembro de te-los visto antes com crianças que não fossem "normais". Também não estão mais naquela idade em que tudo é natural e aceitável. Pelo contrário, estão começando a atentar para os enormes abismos que separam os seres humanos e muitas vezes, nessa fase, o grande barato é discriminar o diferente. Então não nego que minha respiração ficou um pouco suspensa.

Ele tem problemas de fala e dificuldade de entender regras mais complexas das brincadeiras, além, é claro, das características físicas. Mas eles driblaram esses obstáculos. João ficou sendo sempre o pegador e adorou! E os outros dois riam muito enquanto fugiam, mas sempre junto com o João e nunca dele. A comunicação também foi resolvida: eles ficaram perto da mãe do novo amigo e quando precisava ela fazia uma traduçãozinha. E pronto! Superadas as diferenças ficaram sendo só aquilo que sempre foram: crianças.

Óbvio que a babona aqui deu vexame. Ainda que tentando ser discreta não conseguia parar de sorrir e nem conter as lágrimas. Fiquei feliz. Orgulho pela coragem do João, que não se importando em enfrentar uma possível rejeição, fez o que teve vontade de peito aberto e com muita independência. E pelos "meus" meninos que lidaram com aquela situação tão diferente com delicadeza, elegância e generosidade.
É claro que eles perceberam. Dentro do carro me bombardearam de perguntas, que respondi com toda sinceridade. Não deixei de ressaltar a importância e o valor da atitude deles e de explicar que muitas pessoas, até mesmo muitas crianças, não teriam tido um comportamento tão cheio de dignidade e naturalidade.

Adorei o passeio no McDonald's.



Beijos


Ana Mineira

quarta-feira, 5 de maio de 2010

COMPARTILHANDO PÉROLAS




Para Maria da Graça
Paulo Mendes Campos

Agora que chegaste à idade avançada de 15 anos, Maria da Graça, eu te dou este livro: Alice no país das Maravilhas.
Este livro é doido, Maria. Isto é: o sentido dele está em ti.
Escuta: se não descobrires um sentido na loucura acabarás louca. Aprende, pois, logo de saída para a grande vida, a ler este livro como um simples manual do sentido evidente de todas as coisas, inclusive as loucas. Aprende isso a teu modo, pois te dou apenas umas poucas chaves entre milhares que abrem as portas da realidade.
A realidade, Maria, é louca.
Nem o Papa, ninguém no mundo, pode responder sem pestanejar à pergunta que Alice faz à gatinha: “Fala a verdade, Dinah, já comeste um morcego?”.
Não te espantes quando o mundo amanhecer irreconhecível. Para melhor ou pior, isso acontece muitas vezes por ano. “Quem sou eu no mundo?” Essa indagação perplexa é o lugar comum de cada história de gente. Quantas vezes mais decifrares essa charada, tão entranhada em ti mesma como os teus ossos, mais forte ficarás.
Não importa qual seja a resposta; o importante é dar ou inventar uma resposta. Ainda que seja mentira.
A sozinhez (esquece essa palavra que inventei agora sem querer) é inevitável.
Foi o que Alice falou no fundo do poço: “Estou tão cansada de estar aqui sozinha!” O importante é que ela conseguiu sair de lá, abrindo a porta. A porta do poço! Só as criaturas humanas (nem mesmo os grandes macacos e os cães amestrados) conseguem abrir uma porta bem fechada, e vice-versa, isto é, fechar uma porta bem aberta.
Somos todos bobos, Maria. Praticamos uma ação trivial, e temos a presunção petulante de esperar dela grandes conseqüências. Quando Alice comeu o bolo, e não cresceu de tamanho, ficou no maior dos espantos. Apesar de ser isso o que acontece, geralmente, às pessoas que comem bolo.
Maria, há uma sabedoria social ou de bolso; nem toda sabedoria tem de ser grave.
A gente vive errando em relação ao próximo e o jeito é pedir desculpas sete vezes por dia: “Oh, I beg your pardon!” Pois viver é falar de corda em casa de enforcado. Por isso te digo, para a tua sabedoria de bolso: se gostas de gato, experimenta o ponto de vista do rato.
Foi o que o rato perguntou à Alice: “Gostarias de gatos se fosses eu? “.
Os homens vivem apostando corrida, Maria. Nos escritórios, nos negócios, na política nacional e internacional, nos clubes, nos bares, nas artes, na literatura, até amigos, até irmãos, até marido e mulher, até namoradas, todos vivem apostando corrida. São competições tão confusas, tão cheias de truques, tão desnecessárias, tão fingindo que não é, tão ridículas muitas vezes, por caminhos tão escondidos que, quando os atletas chegam exaustos a um ponto, costumam perguntar: “A corrida terminou! Mas quem ganhou?” É bobice, Maria da Graça, disputar uma corrida se a gente não irá saber quem venceu. Se tiveres de ir a algum lugar, não te preocupe a vaidade fatigante de ser a primeira a chegar. Se chegares sempre aonde quiseres, ganhastes.
Disse o ratinho: “Minha história é longa e triste!” Ouvirás isso milhares de vezes.
Como ouvirás a terrível variante: “Minha vida daria um romance”. Ora, como todas as vidas vividas até o fim são longas e tristes, e como todas as vidas dariam romances, pois o romance é só o jeito de contar uma vida, foge, polida mas energicamente, dos homens e das mulheres que suspiram e dizem: “Minha vida daria um romance!” Sobretudo dos homens. Uns chatos irremediáveis, Maria.
Os milagres sempre acontecem na vida de cada um e na vida de todos. Mas, ao contrário do que se pensa, os melhores e mais fundos milagres não acontecem de repente, mais devagar, muito devagar. Quero dizer seguinte: a palavra depressão cairá de moda mais cedo ou mais tarde. Como talvez seja mais tarde, prepara-te para a visita do monstro, e não te desesperes ao triste pensamento de Alice: “Devo estar diminuindo de novo”. Em algum lugar há cogumelos que nos fazem crescer novamente.
E escuta esta parábola perfeita: Alice tinha diminuído tanto de tamanho que tomou um camundongo por um hipopótamo. Isso acontece muito, Mariazinha. Mas não sejamos ingênuos, pois o contrário também acontece. E é um outro escritor inglês que nos fala mais ou menos assim: o camundongo que expulsamos ontem passou a ser hoje um terrível rinoceronte: É isso mesmo. A alma da gente é uma máquina complicada que produz durante a vida uma quantidade imensa de camundongos que parecem hipopótamos e de rinocerontes que parecem camundongos. O jeito é rir no caso da primeira confusão e ficar bem disposto para enfrentar o rinoceronte que entrou em nossos domínios disfarçado de camundongo. E como tomar o pequeno por grande e o grande por pequeno é sempre meio cômico, nunca devemos perder o bom humor.
Toda pessoa deve ter três caixas para guardar humor: uma caixa grande para humor mais ou menos barato que a gente gasta na rua com os outros; uma caixa média para humor que a gente precisa ter quando está sozinho, para perdoares a ti mesma, para rires de ti mesma; por fim, uma caixinha preciosa, muito escondida, para as grandes ocasiões. Chamo de grandes ocasiões os momentos perigosos em que estamos cheios de dor ou de vaidade, em que sofremos a tentação de achar que fracassamos ou triunfamos, em que nos sentimos umas drogas ou muito bacanas.
Cuidado, Maria, com as grandes ocasiões.
Por fim, mais uma palavra de bolso: às vezes uma pessoa se abandona de tal forma ao sofrimento, com uma tal complacência, que tem medo de não poder sair de lá. A dor também tem o seu feitiço, e este se vira contra o enfeitiçado. Por isso Alice, depois de ter chorado um lago, pensava: “Agora serei castigada, afogando-me em minhas próprias lágrimas”.
Conclusão: a própria dor deve ter a sua medida: É feio, é imodesto, é vão, é perigoso ultrapassar a fronteira de nossa dor, Maria da Graça.

terça-feira, 4 de maio de 2010

GEISY ARRUDA

Normalmente, em um outro tipo de acontecimento, com algum outro tipo de motivação, eu teria muita aversão à tal Geisy Arruda, a ex-aluna da Uniban. Considero uma maldição do mundo moderno que as pessoas se aproveitem de incidentes particulares para se lançarem à pseudofama, que geralmente é vázia, sem sentido, injustificável. Não que a dela não seja... Qual a sua relevância? Quais os seus talentos?

Mas, nesse caso, epecificamente, torço muito por Geisy e vibro a cada uma de suas conquistas. As plásticas, o megahair, os desfiles nas escolas de samba, a participação em programas humorísticos, a nova linha de roupas. É tudo muito merecido. E não só por ela, que viveu um
linchamento moral repugnante e agora está sendo recompensada, mas todos os coleguinhas que participaram daquela cena lamentável também merecem. Me divirto pensando neles assistindo às aparições dela na mídia e se contorcendo de raiva, sabendo que foram eles, somente eles que proporcionaram tudo isso.

É incrível que nós mulheres, nessa altura do campeonato, ainda tenhamos que "pagar" por nossas escolhas absolutamente individuais. Vestidos, pulseirinhas, saias, shorts, cabelo, nada é imputável. Está tudo sujeito a castigo que pode ir de piadinha desrespeitosa a estupro.

Não se ouve falar de homens (hetererossexuais) sendo publicamente ridicularizados por nenhuma roupa ou atitude sexualmente provocativa. E, por favor, não venham dizer que eles não têm! Convido qualquer um a dar uma voltinha na pista onde corro e apreciar shortinhos minúsculos... em homens... (e nem venham me dizer que são os gays, porque esses têm bom gosto). E a camisa que nunca para no corpo? E a malhação performática? Tudo visto com tanta naturalidade, como se fosse direito deles se vestirem e se comportarem como acharem melhor... Mas... espera aí? E não é?


É. É direito de todos nós.


Beijos

Ana Mineira