sexta-feira, 12 de março de 2010

ANIVERSÁRIO DE ANJO



anjo com 24 horas de vida


12 de março, 9 anos atrás

Era segunda-feira de manhã e eu já não tinha a menor noção das horas... Cheia de monitores cardíacos, um no dedo, outro na barriga. Minha médica ainda não tinha chegado. Ela mesma havia dado à luz a primeira filha no dia 12 de fevereiro, ou seja, apenas 28 dias antes, mas ia chegar, fazia questão... Deixou o irmão, também médico, lá cuidando de mim e estava tudo na santa paz, até que um daqueles seres irreconhecíveis totalmente vestido dos pés à cabeça sussurou pra ele "Tá de bradi."


Não era pra eu entender. Era daquelas situações em que eles usam uma palavra técnica achando que estão conversando no dialeto de Kripton.
Mal sabiam eles... Eu assistia ER (Plantão Médico na Globo) desde o primeiro do primeiro episódio e poucas semanas antes as gêmeas do George Clooney tinham passado pela mesma coisa e foi um Deus-nos-acuda. Sabia que bradi é bradicardia, o batimento do coração mais devagar que o normal. Nesse caso, se ficar muito lento e por um período prolongado indica sofrimento fetal. Apesar de toda a minha predileção pelo parto normal, tive uma vontade louca de gritar: "Cesárea!!! Agora!!!", mas a voz não saiu...

Nesse instante entrou minha querida mediquinha, segurou minha mão e perguntou: "Tudo bem, Aninha?" Nada de voz, então balancei a cabeça. Um dos outros seres chegou junto dela e disse disfarçadamente
"Tá de bradi". Ela também com voz casual perguntou "Chamou o fulano?" (que eu sabia que era o chefe da pediatria da maternidade). Já, já tinham chamado... Nunca me interessou saber a quantas andou o meu monitor naquele dia, mas me lembro claramente da sensação de ter um rolo compressor em cima do peito, que passava pra frente e pra trás, cada vez que falavam aquilo.

Logo em seguida entra o fulano e mais uma vez alguém diz:
"Tá de bradi" Pra meu desespero ele responde: "É, beltrano me falou..." Pensei: "Como assim, falou?? Então é grave??", mas só consegui tremer. Naquelas alturas eles já tinham delicadamente empurrado o pai e sua câmera pra bem longe e só falavam entre si, muito pouco, de maneira muito tensa. Pedi a Deus pelo meu filho e toda aquela situação virou uma nuvem. De algum lugar minha mediquinha (que era a única que sabia que eu estava entendendo tudo) falou: "Aninha, vou passar um fórcepsinho, tá? Mas é de alivio, bem de levinho..."

Pra quem não fez especialização em obstetrícia pela TV a cabo, fórceps é um instrumento que parece uma garra com ponta de colher. Serve para puxar o bebê, pela cabeça, de dentro do corpo da mãe caso haja necessidade. Por causa do alto risco de danos, hoje em dia, quase não é usado. Só a tal de alívio, que é apenas pra dar uma forcinha mesmo
e, ainda assim tem que ser com o máximo cuidado. Mas a maioria dos médicos brasileiros, atualmente, opta pela cirurgia. Somos os campeões em número de cesariana no mundo (Ehhhh, que maravilha!!). Eu, pessoalmente, nasci de fórceps (e consegui pensar nisso na hora!!!). Só olhei nos olhos dela por cima da máscara... Ela me conhecia muito, sempre zelou por mim, com certeza faria o melhor por nós dois... Então, ainda sem conseguir falar, acenei com a cabeça. Lágrimas escorriam enquanto eu pensava na criaturinha cianótica (roxinha por falta de oxigênio... sim, eu falo mediquês mesmo) e silenciosa que estava por aparecer...

Segundos depois ele chorou forte. Olhei e não estava roxo, era vermelhinho. Meu coração deu um salto! Saí do transe. Olhei para o relógio na parede: 12:25. Senti imediatamente todo o alívio da equipe... O tal do irmão também médico, que estava eufórico, vendo o estado de choque do pai, pegou a filmadora que tinha ficado abandonada em algum lugar,
começou a gravar, e mandou o coitado acordar e tirar foto. O pediatra pegou o bichinho e deu uma revirada nele com a expressão serena. Minha voz voltou pra fazer a única pergunta que importava: "Ele tá bem?" e a resposta: "Ele tá ótimo!" E estava mesmo! Lindo como um bibelô!

Foi assim o dia mais feliz da minha vida.





Beijos

Ana Mineira

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